domingo, 15 de dezembro de 2013

Por que sempre caímos na dicotomia?

Inato ou adquirido? Biológico ou Ambiental? Objetivo ou subjetivo? Individual ou social? A análise científica dos fenômenos está constantemente atravessada por dicotomias, e, no estudo etiológico do Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH), não poderia ser diferente. As discussões quanto à origem do TDAH são frequentes. Algumas técnicas de neuroimagem fornecem evidências sobre ser este um transtorno neurobiológico, outros estudos sobre a genética do TDAH se dedicaram a apontar até mesmo sua recorrência familiar – “57% das crianças com TDAH têm pais afetados com o transtorno, com um risco de 15% entre irmãos. Também confirmaram esta teoria os estudos feitos com gêmeos monozigotos, nos quais se constatou a concordância de 51%, enquanto em dizigotos a concordância é de 33% com maior incidência de TDAH em familiares de primeiro grau do indivíduo afetado.” (FARAONE & cols., 1992 apud COUTO; MELO-JUNIOR; GOMES, 2010, p. 3). Por outro lado, pesquisadores apontam o TDAH como uma patologia construída, que deve ser analisada considerando também o contexto onde se desenvolve porque o crescente número de diagnósticos movimenta o mercado farmacológico, dado que, o metilfenidato (Ritalina) é uma medicação comumente recomendada no tratamento do transtorno, assim como outros estimulantes, e interesses desta indústria podem estar envolvidas no processo de diagnóstico.

A neurobiologia...

No entanto, pesquisas assinalam que há, realmente, sistemas neurobiológicos envolvidos no Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade, de modo que “existe uma disfunção da neurotransmissão dopaminérgica na área frontal (pré-frontal, frontal motora, giro cíngulo); regiões subcorticais (estriado, tálamo médiodorsal) e a região límbica cerebral (núcleo acumbens, amígdala e hipocampo).” (COUTO; MELO-JUNIOR; GOMES, 2010, p. 4). Alterações nestas regiões estariam envolvidas com a impulsividade enquanto que nos circuitos do córtex pré-frontal e amígdala influenciariam, além da impulsividade, em esquecimento, distração e desorganização. A influência do sistema noradrenérgico nos processos de atenção veio a ser descoberto posteriormente a estes estudos.

O contexto...

Um fato curioso nesse sentido é a comparação que foi feita entre crianças americanas e francesas quanto ao diagnóstico do TDAH. Enquanto nos Estados Unidos ao menos 9% das crianças em idade escolar, na França este número se reduz a menos de 0,5%. Por que isso ocorre? Os psiquiatras americanos consideram as causas do TDAH como biológicas, logo, o tratamento também é biológico, com estimulantes como Ritalina e Adderal. Já os psiquiatras franceses concebem o transtorno como uma condição médica de causas psicossociais e situacionais. Então, avaliam o problema segundo o contexto social subjacente à criança e tratam com psicoterapia e aconselhamento familiar. Os psiquiatras franceses criaram, inclusive, um sistema de classificação alternativo ao DSM-3, utilizado pelos americanos. O foco deste sistema francês, o CFTMEA (Classification Française des Troubles Mentaux de L’Enfant et de L’Adolescent ), está em identificar e tratar as causas psicossociais que subjazem aos sintomas das crianças, ao invés de disfunções químicas e biológicas.

Outro fator que está implicado neste processo de debate biológico-cultural e que deve ser considerado aqui é a diferença entre os estilos de paternagem americana e francesa. Os pais franceses têm uma filosofia diferente de disciplina, os limites são firmemente estabelecidos e a hierarquia familiar é clara, enquanto nas famílias americanas costuma ocorrer o inverso.

Leia mais em: http://goo.gl/5kbH8

Quebrando a dicotomia...

Embora argumentos de ambos os lados tenham sido apresentados, é importante conceber o TDAH como fruto da interação organismo-meio. Não determinado pela neurobiologia ou pelo contexto, não de que lado está a razão, mas como a biologia e o ambiente mutuamente se influenciam na construção do problema. Porque sempre caímos na dicotomia se uma visão interacionista é sempre mais produtiva?

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